Prevenção da Recaída e Treinamento de Habilidades Sociais

Introdução

O comportamento do dependente de substâncias psicoativas tem como característica a busca de alívio para desconforto de ordem psíquica, recompensa imediata, prazer, relaxamento, socialização, desinibição, sensação de controle e bem estar, sensação de melhora no desempenho profissional, social.
A reabilitação do comportamento dependente demanda uma espécie de mutirão de esforços técnicos e profissionais orientados pelos conhecimentos produzidos cientificamente.


O programa de prevenção a recaída em conjunto com o treinamento de habilidades sociais entra como um coadjuvante importante e integrado a um tratamento da dependência química eficaz.


A prevenção da recaída é eficaz para pacientes dependentes de cocaína, diminuindo o risco do consumo da droga por seus participantes e ajudando os mesmo no desenvolvimento de habilidades para identificar situações de vulnerabilidade, evitar situações de alto risco e a utilizar estratégias de enfrentamento compatíveis com o desejo de permanecer abstinente.

Prevenção a Recaída

A Prevenção a Recaída (PR) é um programa de técnicas estratégicas de enfrentamento, cujo objetivo fundamental é ensinar o indivíduo fazer o próprio gerenciamento das suas situações de risco, dos estados emocionais, estresse que podem levá-lo ao retorno do uso de substâncias psicoativas, interrompendo a abstinência.

O método foi desenvolvido com a finalidade de manter a mudança alcançada no curso do tratamento.

O processo de recaída

Para a teoria da PR, o indivíduo em abstinência experimenta uma sensação de auto-eficácia, ou seja, sente-se no controle da situação, livre das pressões internas e externas para consumir uma substância psicoativa.

Essa sensação de controle e bem- estar sofre abalos na presença de situações relacionadas ao consumo, denominadas situações de alto risco

Os estados emocionais negativos, as pressões sociais e os conflitos interpessoais são consideradas as situações de risco mais comumente relacionadas à recaída.

Na vigência de uma situação de risco, sairá fortalecido aquele que conseguir executar uma resposta de enfrentamento cognitiva ou comportamental de enfrentamento para o problema.

Por outro lado, a ausência de resposta de enfrentamento diminui a sensação de auto-eficácia.

O controle é ainda mais comprometido quando o indivíduo manifesta expectativas positivas em relação ao consumo – “se eu voltasse a fumar agora que estou abstinente há seis meses, acho que o efeito do crack seria diferente e conseguiria usar controladamente” – ou auto-indulgente – ” tenho trabalhado tanto, me matado para sustentar a casa e a todos, acho que mereço uma folga de tudo isso”.

Por fim, as decisões aparentemente irrelevantes (DAI) e sem nenhuma relação com o uso da droga, são na realidade parte de uma sucessão de condutas e cognições disfuncionais, que aumentam o risco do retorno ao consumo – “abstinente há dois meses e sentindo-se muito bem, decidiu naquela noite passar no posto de gasolina onde outrora encontrava seus amigos do crack, pois sentiu vontade de comer o sanduíche que era feito lá”.

O retorno ao consumo resulta no efeito de violação da abstinência (EVA), uma sensação irremediável de derrota perante ao fracasso do propósito inicial de manutenção da abstinência absoluta.

Nesse contexto de “tudo ou nada”, todo o esforço de abstinência inicial é eclipsado pelo lapso, com aumento da probabilidade de extensão do mesmo, inclusive com abandono do tratamento e dos pontos de apoio adquiridos durante o processo de abstinência.

[Figura 1]

Aplicação terapêutica da prevenção da recaída

A recaída pode ser entendida como um colapso ou revés na tentativa de uma pessoa para mudar ou modificar um comportamento.
Baseada nos princípios da teoria do aprendizado social, a PR é um programa de autocontrole e automanejo que combina procedimentos de treinamento das habilidades comportamentais, intervenções cognitivas e de mudança no estilo de vida.

O programa é composto por Intervenções Específicas e Intervenções Globais para prevenir recaídas que serão apresentadas um pouco mais adiante.
Para a PR, mais importante que a causalidade, a dependência química é um hábito adquiridoe aprendido, por meio do qual a substância vai paulatinamente sendo utilizada para lidar com situações , emoções e experiências de desprazer – ou seja, uma estratégia de enfrentamento disfuncional aprendida.

Há uma conjunção de efeitos de curta duração da substância, capazes de aliviar os desconfortos do indivíduo, com outros de longa duração, como a incapacidade em lidar com situações dolorosas (frustração) combinada à baixa auto-estima e auto-eficácia para resolução de problemas.

Para PR, no cerne da dependência está a manutenção dos comportamentos mal-adaptativos.

Desse modo, o tratamento bem-sucedido não parte em buscas de causas, mas da compreensão do funcionamento presente e do planejamento para mudanças futuras.

Nesse caso, cabe ao paciente assumir a responsabilidade pelo processo de mudança, comparecendo às consultas, identificando os fatores de risco e manutenção do consumo e desenvolvendo estratégias de modificação em conjunto com o profissional que o acompanha.

O indivíduo, assim, é o agente responsável por sua mudança.

Estrutura terapêutica da prevenção da recaída

As abordagens de prevenção da recaída para usuários de cocaína tendem a ser mais estruturadas em relação às demais substâncias psicoativas.

As sessões são estruturadas para a abordagem de temas específicos.

Em geral, o primeiro terço da sessão é dedicado à avaliação das metas estabelecidas na semana anterior, seu sucesso e intercorrência; a segunda parte é mais didática, com utilização de outras técnicas, tais como o treinamento de habilidades sociais; o terço final é utilizado para o planejamento da próxima semana.

O enquadre terapêutico da prevenção da recaída permite ainda a atribuição de tarefas e atividades – especialmente as relacionadas ao treinamento de habilidades sociais – fora do tempo da sessão ou clínica.[figura 2]

A combinação entre lição de casa, aquisição de novas habilidades e melhora do prognóstico dos usuários de estimulantes vem sendo demonstrada e deve ser encorajada entre os pacientes.

Intervenções Específicas da Prevenção da Recaída

  • Técnica 1: Identificação do estado de motivação
  • Técnica 2: Identificação das situações de risco
  • Técnica 3: Mudança do estilo de vida
  • Técnica 4: Identificação do processo da recaída
  • Técnica 5: Identificar as decisões aparentemente irrelevantes
  • Técnica 6: Fatores cognitivos associados à recaída
  • Técnica 7: Confluência de situações de risco.

A recaída não é um fato isolado, mas sim um processo encadeado por uma sucessão de eventos, atitudes, pensamento e sentimentos – ‘aparentemente irrelevante’, que antecedem o retorno do consumo.

Essa dinâmica deve ser analisada com o paciente.

Isso inclui também as recaídas anteriores: a dinâmica dos processos mentais e comportamentais que resultam na recaída auxiliam o paciente em sua auto-avaliação contínua, além de oferecer uma estratégia interventiva na prevenção de novas recaídas.

Esta é uma etapa fundamental do programa, onde serão revistas crenças, pensamentos, e o aprendizado e aquisição de novos pensamentos, hábitos e comportamentos.

Os pacientes que conseguem identificar as situações de alto risco, bem como as determinantes que o deixam mais predisposto a recair – gatilhos e estados emocionais específicos – costumam tomar atitudes mais assertivas com efeito benéfico sobre sua auto-eficácia, afastando-o progressivamente das situações de risco.

No entanto, nunca se deve subestimar a força dos pensamentos e das demandas emocionais, diante de uma situação de dificuldades, problemáticas ou estressantes, mesmo após um período de aprendizado e abstinência.

Justamente nestas situações, surgem o desejo por indulgência, quase sempre acompanho por decisões aparentemente irrelevantes.

O lapso é um evento isolado, cuja culpa excessiva da violação da abstinência transforma em evidência irrefutável de fracasso, tornando mais provável a reinstalação do comportamento de consumo anterior.

Estratégias de reatribuição de significados são utilizadas para readquirir o controle evitando o próximo uso

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